terça-feira, 30 de novembro de 2010

AINDA A TERTÚLIA

MINISTÉRIO


Pessoa a presidente
a 1º ministro talvez Camões
na saúde Miguel Torga
Antero na pasta dos milhões.
António Nobre nos estrangeiros
Jorge de Sena na defesa
de Portugal
Cesário Eugénio e o O'neil
todos na mesma mesa
estoicamente sentados
defendendo o social.
Florbela na educação
na cultura eleita a Sofia
e na assembleia os deputados
todos todos
os amigos da poesia.

AMIGOS DA POESIA

O mote da poesia da nossa tertúlia era exactamente o título em epígrafe e meia hora antes da reunião saiu-me assim:

se os ventos vindos do mar
fossem palavras e maresias
ouviriam este sussurrar
dos amigos da poesia

sussurros revoltas e lamentos
do navegar do dia-a-dia
são tempestades são os ventos
dos amigos da poesia

e se tantos neste naufragar
discutem orçamentos economia
neste país prestes a afundar
são tão poucos os amigos da poesia.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

MARIO CESARINY

Thursday, November 26, 2009

MÁRIO CESARINY (LISBOA, 9 DE AGOSTO DE 1923 – LISBOA, 26 DE NOVEMBRO DE 2006)


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O Papá que veio do Leste, Mário Cesariny, 1980


PASTELARIA

Afinal o que importa não é a literatura
nem a crítica de arte nem a câmara escura

Afinal o que importa não é bem o negócio
nem o ter dinheiro ao lado de ter horas de ócio

Afinal o que importa não é ser novo e galante
– ele há tanta maneira de compor uma estante

Afinal o que importa é não ter medo:
fechar os olhos frente ao precipício e cair verticalmente no vício

Não é verdade rapaz? E amanhã há bola
antes de haver cinema madame blanche e parola

Que afinal o que importa não é haver gente com fome
porque assim como assim ainda há muita gente que come

Que afinal o que importa é não ter medo
de chamar o gerente e dizer muito alto ao pé de muita gente:
Gerente! Este leite está azedo!

Que afinal o que importa é pôr ao alto a gola do peludo
à saída da pastelaria, e lá fora – ah, lá fora! – rir de tudo

No riso admirável de quem sabe e gosta
ter lavados e muitos dentes brancos à mostra


Mário Cesariny, in Nobílissima Visão, 1959

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

POEMA ESQUECIDO

Descobri este poema que ficou esquecido num pequeno caderno, algures numa gaveta. Vem hoje a lume e está actual.


Sei de um país moribundo mergulhado numa Europa
que tarda em fazer marear as pequenas naus
que nela se aventuraram.

Sei de um país inquinado por marés de incompetentes
que corrompem as amuradas de um barco
que zarpa sem destino.

Sei de um país angustiado que pergunta de boca-em-boca
que presente que futuro que destino.

E os ventos que nos fustigam não trazem novas
são rajadas de dúvidas são males e calamidades
que nos fazem vergar o pensamento
quebrar o corpo aniquilar a esperança.

Sei de um povo que já foi país
que foi para além do seu tamanho
ultrapassou oceanos e adamastores
desbravou savanas no fim do mundo
espalhou padrões em terras longínquas.

Sei de um povo que vive esmagado pelo martírio
encurralado nas tramas que os donos deste país
urdem e tecem no silêncio que o amordaça.

Sei de um povo que tarda em se levantar!

POESIA

A proposta da nossa tertúlia de poesia para esta quarta-feira era "a idade avançada", como deixei correr o tempo só hoje, uma hora antes peguei no tema. Saiu assim:


Já não tenho idade para mamar
pois a minha idade avançada
leva-me apenas a navegar
nas saudades da minha amada.

Mas senhor
porque me dais tanta dor
ao afundar esta nau
estando eu na amurada?

Eu sei, eu sei
que posso naufragar
mas apesar da idade avançada
tenho vela tenho verga
tenho pau
ainda posso remar.

Mas as crianças senhor
vivem de sonhos e não sonham
aonde vão parar
e sem remos e sem amor
têm um juro que lhes deixamos
e que mais tarde vão pagar.

Já não tenho idade para abocanhar
a doce teta, a maminha
desta "vaca" Pátria minha
que deu de mamar aos glutões.

Ah meu país doente
minha Pátria enamorada
quanto de nós precisas
(aqueles de idade avançada)
para que ergamos o país
levantemos a bandeira
e empunhando a espada
dar em alguns uns safanões.

ALMADA NEGREIROS NO SEU MELHOR

"As construções do estado multiplicam-se a olhos vistos, porém as paredes estão nuas como os seus muros, como um livro aberto sem nenhuma história para o povo ler e fixar"



Não me digas Almada, as grandes obras continuam? e o livro continua aberto sem histórias para contar? Onde raio é que eu já ouvi isto?!!

OUTRA VEZ ALMADA NEGREIROS

Últimatum futurista às gerações portuguesas do século XX:

"O povo completo é aquele que tiver reunido no seu máximo, todas as qualidades e todos os defeitos. Coragem portugueses só vos faltam as qualidades!"

AINDA ALMADA NEGREIROS

"É preciso criar a Pátria portuguesa do século XX"


E a do século XXI?

REVIVER ALMADA NEGREIROS

"Uma geração que se deixa representar por um Dantas é uma geração que nunca o foi. É um cóio de indigentes, de indignos e de cegos, é uma resma de charlatães e de vendidos e só pode parir abaixo de zero. Abaixo a geração! Morra o Dantas, morra. PIM!"

IN MANIFESTO ANTI-DANTAS

Será que este manifesto não tem cabimento noutra era e com outro Dantas?

terça-feira, 16 de novembro de 2010

A PENA E A ARMA

Dizem que a pena é uma arma, que dispara palavras, que fere e mata com contundência. Às vezes penso que tenho pena que a minha pena não seja uma arma. Talvez a eficácia fosse maior.

SURREALISMO

Ah Portugal, Portugal
país das maravilhas
do mar e do sol
do cheiro a maresia
dos endémicos
sabedores e doutores
plateia de pindéricos
que falam de crise
dos suprimes
dos sistémicos
água dura
em pedra mole
que nos inunda
e afunda
com palpites e
contágios
que a guita não abunda
na nossa mão
mas na deles não
e falam como entendidos
posam com ar solene
nos nossos "times"
na televisão
falam de governo de salvação
uns sim outros não
querem sufrágios
porque são devotos
aos votos claro
porque os tachos
ai os tachos são tão lindos
os maganões
dão status dão milhões
e o zé preso aos
grilhões
dessa miséria secular
dá-lhes a teta
para mamar
nesta Cornélia em que este país
se transformou
antro de vampiragem
onde uns comem tudo
e os outros pagam
para salvar um país
que é cada vez mais uma miragem.

sábado, 6 de novembro de 2010

AINDA O EL CORTE INGLÈS

Estes cursos que o Âmbito Cultural do El Corte Inglès proporciona, não nos enriquecem apenas no aspecto cultural mas também no aspecto humano. Novos cursos, novos conhecimentos e novas amizades. Como sou um velho frequentador do El Corte Inglès e dos seus programas culturais, ganhei estima pela Susana Santos alma mater destas iniciativas e foi com agrado que na última aula de História de Portugal a ouvi referir-se ao meu livro "Éramos todos bons rapazes" e à ligação que tenho com o El Corte Inglès. Uma palavra para a Mariana Rodrigues, novata nestas andanças do âmbito e que se tem revelado uma simpatia para com os frequentadores dos cursos. Desta vez e ainda que sentado no mesmo lugar de sempre, fiquei rodeado pela Maria José, colega doutros cursos e pela Armanda Gonçalves estreante nestes ambientes mas que simpaticamente, nos deu a sua atenção.

COMEÇOU A NOVA ÉPOCA

Começou em Outubro a época cultural do El Corte Inglès. Dos cursos antigos faltava-me apenas o de Cinema, dado pelo António Pedro Vasconcelos mas porque as inscrições são às centenas só agora e depois de várias tentativas, consegui o desejado ingresso neste curso. Sempre gostei de cinema, vi centenas de filmes até hoje, pertenci a um cine clube, ajudei na programação dos filmes no cinema da minha cidade, numa história curiosa que um dia contarei. No entanto hoje, por razões várias, o meu tempo de cinéfilo resume aos filmes que compro ou vejo na televisão. Raramente vou a uma sala, porque nada é como dantes. Detesto as pipocas, as salas pequenas, os filmes sem intervalo e sobretudo a poluição sonora que debitam na amostragem dos filmes. Mas cinema é cinema e foi bom ouvir o António Pedro Vasconcelos, foi bom reviver pedaços de antigos filmes que marcaram a minha juventude, foi bom conviver com uma plateia que tem os mesmos sentimentos para com o cinema. Mas a minha participação nesta época do âmbito Cultural não se ficou por aqui, pois começou um curso novo de História de Portugal para o qual consegui por via de uma desistência, um lugarzinho ao sol, para ouvir e relembrar a nossa história, tão rica (e pobre...) de quase novecentos anos de vida. Quanto deste Portugal passado está hoje presente nestes discursos de hoje. Novecentos anos de história e não aprendemos nada, repetimos os mesmos erros, dizemos as mesmas palavras, mergulhamos no mesmo abismo. Foram reis e princesas, foram nobres e burgueses, hoje são doutores e ministros, no mesmo tabuleiro, no mesmo mar de enganos, ludibriando, corrompendo. E o Zé meu Deus e o Zé?