domingo, 8 de fevereiro de 2009

QUATRO CASAMENTOS E UM FUNERAL

Segunda-feira, nove da manhã, desço a rua Alexandre Herculano, volto aos sinais e sigo em frente até à rotunda. Volto à direita e vou pela rua paralela à via férrea, atravesso o jardim central e estaciono junto à Universidade Sénior. Desço a escada e estou na minha sala de aulas, arrumando as mesas, colocando o material e esperando pelos alunos.

Terça-feira bem cedo rumo à IC 19, percorro o trajecto em andamento mais ou menos rápido até à Segunda Circular, tomo o lugar na fila que escorre mais lentamente e passando o nó de Pina Manique rápido estou nas torres de Lisboa. Entro na empresa, faço o ritual dos visitantes e depressa estou no elevador até ao terceiro andar. Na sala respira-se o trabalho, eu sou a desestabilização, entro pé-ante-pé, percorro as secretárias, dou um olá em geral e vou até aos meus antigos colegas. Um beijo, um aperto de mão, o convite para o café, e lá vamos os oito para o pequeno bar mordiscar um sortido de chocolate, pôr as notícias da semana em dia e dizer em surdina: "bolas o euromilhões não há meio de nos sair". Um adeus, até para a semana, sair para outros andares, ver uma e outra cara conhecida e sair horas depois naquela liberdade que eles não têm. Aquela "prisão" que já foi minha é agora um areal onde de me vou espraiar...

Quarta-feira vou pela tarde até Telheiras, espero junto ao colégio pela hora certa. Entro. Espreito pela vidraça da porta o desassossego da pequenada, assim que me vê, M... salta da cadeira e corre aos gritos para os meus braços: avô... E os dois, bem juntos porque a chuva não pára, corremos para o carro e rumamos a casa. As histórias sucedem-se, a irreverência continua, e ambos no chão da sala revivemos a Bela Adormecida, a Aurora e o Príncipe, as pollis, o Mickey e a Minnie. A noite chega, a chuva continua a cair e nós vivemos.

Quinta-feira. O Atelier espera por mim, pelo chão dois ou três quadros inacabados, a um canto o retrato de M por acabar, em cima da mesa junto a um pequeno sofá um livro que terminei de ler e que espera uma arrumação na estante. Não me apetece pintar, ler também não, muito menos arquivar aquele monte de papéis que esperam a sua vez, vou para o computador e escrevo. Pelas cinco da tarde passo pelos meus amigos que se reúnem em plena rua ao frio e à chuva. Dois dedos de conversa, encontros e desencontros de palavras, discussão dessa clubite aguda e consenso geral: este país está uma merda. Volto a casa, arrumo os tarecos, ponho a loiça a lavar, faço o jantar e espero que pelas dez da noite venha a primeira dama (morta de trabalho) e o príncipe herdeiro para um jantar feito de palavras gastas.

E UM FUNERAL

Percorro a IC 19 até Sintra debaixo de um tempo esquisito. Ora nublado ora solarengo. As novas obras, com a abertura de uma nova via, deviam fazer-me chegar rápido ao destino, mas infelizmente e à portuguesa, fazem-se desvios, sinalizados só no primeiro troço, depois... bem depois é atirar à sorte o rumo que devemos seguir. Por puro instinto desviei-me sempre bem e cheguei à capela a horas. O sol estava fortíssimo, as nuvens inquietas, a chuva recolhida. Puro engano! Em pleno cemitério, o sol recolheu-se, as nuvens zangaram-se e a chuva desabou, em catadupas. Mas a vida continua.

Sem comentários: